domingo, 11 de outubro de 2009

POEMA DE DEUS

αὐτοῦ γάρ ἐσμεν ποίημα, κτισθέντες ἐν Χριστῷ Ἰησοῦ ἐπὶ ἔργοις ἀγαθοῖς οἷς προητοίμασεν ὁ θεὸς ἵνα ἐν αὐτοῖς περιπατήσωμεν.
“É que somos obra de arte, poema de Deus. Ele criou-nos em Cristo Jesus para produzirmos boas obras, as quais que Ele de antemão preparara para nelas vivermos e nos movermos.”
Paulo, Carta aos Efésios 2:10


Sou um poema de Deus
manufacturado de palavra e terra
coroado de sol
de resplendor de aurora

No chão a tua mão pouso não achou
do vermelho barro que colheste
moldaste os meus rins
os meus ossos enrijeceste
vaso que
de água e sangue encheste

Do rude filão apartaste a ganga
e no lume
de milhares de sóis purificaste
o ouro da minha carne

À minha pele
não são ignotas a plaina
nem aos meus braços
a talha a martelo e escopro
o meu rosto
marchetado
de finas e várias peças de escultura
mais preciosas que mármore

no fundo da caverna da gestação
à massa bruta entreteceste
textura
partes órgãos funções
um coração que estremece e chora
olhos que vêem nariz que cheira mãos que apalpam
boca que fala
não um pedaço de madeira esculpida por um Gepeto
a quem uma fada deu vida

mais muito mais

em minhas narinas sopraste
e os meus pulmões respiraste
o sopro que é agora
a minha voz
que respira fala e profetiza e diz o poema

precisamente como tu

sou criação tua
poema teu
deste-me a tua palavra
e a tua arte
fizeste-me mundo e criação
filigrana de galáxias
nas raias do infinito
estertor de supernovas
expansão de nebulosas
sóis e planetas
asteróides e cometas
sistemas estelares e satélites
quasares e pulsares

fizeste-me mundo terra azul
crespidão de montes
explosão de vulcões
separação de terra e águas
rios de vales fendentes
árvores elevadas contra o vento
flores que ateiam cores e perfumes
do mar pleno o rugido
luares e canções
florestas e falésias
concerto de violino e risos de criança
semente caule e fruto

fizeste-me como tu
poeta

e assim mundo
com outros mundos universos paralelos
com outros poemas
transformados em poetas
e pintores e arquitectos
de mãos dadas
e vozes geminadas
faremos de toda a terra a obra que quiseste

a obra que preparaste
– eis aí a seara pronta para a ceifa


Rui Miguel Duarte (Herserange, França, 10 de Outubro de 2009)

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