segunda-feira, 23 de abril de 2012

Novo livro de J.T.Parreira: Quando eu era menino lia o Salmo oitavo


A poesia de J.T.Parreira é poesia maior. É poesia que, ao ser lida, inevitavelmente produz a libertadora (e infelizmente rara) sensação de uma lufada de ar que nos eleva e, de roldão, transmigra-nos de nosso dia-a-dia corrido e muitas vezes repleto de sensaboria, para a dimensão poiética, de enlevo, fascinação e gozo auferidos pelas palavras  ao serem laboriosamente re-alinhadas para que ofereçam o seu melhor.

Nesses 29 poemas, escritos entre fins de 2011 e início de 2012, o vate português dá provas de seu dom de ampliar, ou melhor dito, alar as palavras, trabalhando os temas bíblicos, reafirmando poeticamente sua transcendência divina, ao re-capturar e re-vestir o que eu chamaria de seu élan  (ímpeto, vigor) devocional, como no poema que inspira o título do livro (O Salmo VIII), ou neste Pró Salmo 121:

Elevo os meus olhos para os montes
e há um monte deles
mesmo em frente,  quando caminho
no cimo dos montes as Tuas mãos
fazem o resguardo do abismo
a minha fadiga é soletrada nas palavras
com que peço socorro, o meu olhar
por isso se alonga, outras vezes
vou mais depressa
pareço um adolescente a distender as pernas
e corro sem temer o sol
nem os mistérios da lua.
Sou tão pouco perante os montes
mas eles ficam para trás e não são
mais do que poeira amontoada.

Como editor, me regozijo em oferecer aos leitores mais este volume, pequenina cornucópia de pérolas - a serem degustadas com os olhos da alma. E singela amostragem do melhor da poesia evangélica produzida atualmente em nossa língua.

Sammis Reachers

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quinta-feira, 19 de abril de 2012

LISTA DE RECEIOS

Tenho receio de saber coisas de mais
o número do meu violino
no céu

os sonhos, como sabem os sonhos
que é noite no meu cérebro
onde é a fechadura das almas
se nos olhos se na voz
o silêncio
de que é feito o interior dos Himalaias
Tenho receio de saber coisas
que se passam
no arco da noite entre as estrelas
ou na noite urbana de pedra
e de segredos.

3/01/2012


 © J.T.Parreira

domingo, 15 de abril de 2012

MUDA

como um cordeiro que é levado ao matadouro ou como uma ovelha emudecida nas mãos do tosquiador
Isaías 53:7

vi pelos olhos de Isaías

a ovelha levada
diante dos nossos olhos
em marcha lenta
sobre o gume da faca

os escombros do mundo
dissolviam as maçãs do rosto
a mão do carniceiro
não é menos áspera
mas quiçá será mais compassiva
e lhe aliviará todo esse peso
que lhe cerra a garganta

se o gume finda na ponta
vale mais apressar o golpe
para que de uma vez por todas
se solte e ecoe o grito emudecido
se solte a dor a derradeira
como feto retido no útero
o grito que pesa sobre a espinha

é urgente a declaração
de que a marcha do silêncio
terminou

lá, no lugar onde o céu
se rasga da terra
lá, onde vi a carne
posta perante Deus e os homens
a carne que cala a boca
do mundo


Rui Miguel Duarte
15/04/12

O meu primeiro Salmo VIII



Quando eu era menino e lia o Salmo
oitavo, ficava cheinho de vontade
de entrar dentro dele, o mundo
criado estava todo ali, até os anjos
eram pouco maiores que os homens
as aves passavam e era nelas
que media o céu, e as estrelas?
essas cabiam nos olhos
os peixes respiravam a água dos mares
tudo era admirável e bastava uma ovelha
para o meu riso correr de um lado
para o outro dos meus pequenos lábios.

15/4/2012


© J.T.Parreira

sexta-feira, 13 de abril de 2012

O Vale de Baca

Vou aproveitar o dia
Para anoitecer

Sou sargento de uma equipe
De infiltração & sabotagem do SAS*
Instalo explosivos nas pilastras de uma ponte
Em algum país insurgido
Contra os objetivos da Inglaterra,
Do Reino
Mas o tenente diz que não presto para o serviço:
eu faço perguntas

No mais sou como Adão,
Vivo de explodir pontes

Penso nas poesias de outro poeta,
Herege, Willian Blake
Meu discernimento tem se estreitado, Senhor
Dias vejo o mal
Em tudo
Dias mais não vejo o mal
Em lugar algum
Como se bem e mal se fundissem
Numa massa insossa, vale de ossos s-
ecos ou poema de Blake
Onde trafego como cósmico calango

Dias maus em que pareço
lutar uma guerra mais que perdida: olvidada

Lembra-te de mim nas trinch-
eiras de minha fraqueza,
Rei meu; livra-me da morte de con-
fundir

*Tropas de Elite do exército inglês

Sammis Reachers

terça-feira, 10 de abril de 2012

As palavras que me assustam




Ironia ou não as palavras assustam-me
Por isso vacilo no momento de as largar
Porque me pertencem
Receio as leituras erradas que possam delas,
e com elas fazer
Mas os gestos, os olhares,
as expressões faciais,
os sorrisos,
largo-os instantânea
e destemidamente
Só as palavras é que não!

10/4/2012
© Florbela Ribeiro

segunda-feira, 9 de abril de 2012

HOJE, PÁSCOA



“Iam a correr…”
Evangelho segundo João 20:4

hoje preferimos
deixar o sono dormindo na cama
e correr, correr ao túmulo
porque nos disseram que a morte
havia de si própria fugido

deixámos tudo até o peixe
fazer a sua faina nas brasas
e a fome arder só ao lume
e correr, correr ao túmulo
porque nos disseram que a pedra
havia desertado

hoje preferimos
saltar obstáculos
e mesmo pisar urtigas com ambos os pés nus
porque nos disseram que a vida
conquistara o vento

preferimos ao linho
molhado em aloés
antes molhar as frontes
com a água corrente da vertiginosa pressa
de chegar ao túmulo
o lugar de descansar
do tumulto o coração

Rui Miguel Duarte
9/04/12

Viveu sempre sem casa



Viveu sempre sem casa
sem mesa onde pousar os braços
cordiais exaustos da multiplicação
dos pães, sem chão
onde enxugar os pés de caminhar no mar
viveu sempre sem a seda oriental
da almofada, dormia sobre os caminhos
porque tinha a Hora a cumprir
não tinha terrenos, nem casas, nem sequer
a madeira com que fora em tempos carpinteiro


No dia em que morreu, todos
quiseram dar-lhe casa, uma rocha
aberta para o fundo
para poder descansar, um túmulo
quiseram por fim que habitasse
atrás do alto porte de uma pedra
esqueceram que Ele romperia
com seu corpo os atavios
e o suave descanso da morte.

8/4/2012

(c) J.T.Parreira

sábado, 7 de abril de 2012

O QUE SE MOSTRA

“Depois mostrou-lhes as mãos…”
Evangelho segundo João 20:20

mostro-te as minhas mãos
as mãos que reconheces
pelo toque vazio dos pregos

estas mãos que aspergiram
os rios imortais entre os montes
mãos que dispersaram
no firmamento as poeiras
do tempo
inaugurando o ciclo das estações
debaixo da pulsação do sol
que criaram as notas musicais
para tu cantares
mãos que esculpiram os rostos
dos homens em madeira rara

mãos cujos dedos são finos
como os das aves
e cujas palmas a morte
pouco a pouco amarrotou
até à extinção total

mostro-te estas mãos
que beijaram os espinhos
e deles extraíram latejante
a rosa

7/04/12

terça-feira, 3 de abril de 2012

Acerca da Intentona dos Ressuscitados do Planeta Fesann: Fragmentos de uma carta rebelde



Sem-Nome a todos nas três luas de Fesann: Luz e Paz.
Este é o último comunicado geral a vós todos endereçado,
haja vista a iminência de nosso ataque.
O dia já foi assinalado. Ficai atentos:
ao toque da Tricórnea trombeta do General Alado Ralifax,
o Porta-Estandarte,
iniciaremos nossa parte do ataque;
o Generalíssimo Alado Ghalifax e suas
Hostes de Honra atacarão pelos céus,
enquanto os Servos Fiéis avançarão pelas terras
flanqueando as forças terrestres do inimigo

Nós atacaremos por baixo e de dentro,
usaremos as sombras, os túneis e esgotos
de nossa habitação

Repassem a mensagem a cada cão,
cada despedaçado que traga secretamente em seu seio
a marca cruciforme
urge que esta mensagem flua por cada sarjeta,
nas prisões, nas cozinhas e serventias dos palácios
sabotaremos todas as estruturas de suporte
da Opressão de Xathan
disseminaremos a gloriosa Mensagem da Chave
no miolo próprio da Fornalha Infernal

Aquele que contra tudo e todos
nos abriu a Porta
conta agora conosco

Nunca houve ilusões, e agora mais que nunca
seriam tais coisas inúteis a nós e ao Rei:
 somos os sem-patente do Exército do Monarca,
sabotadores e guerrilheiros,
e plenamente dispensáveis. A nós
caberão as missões suicidas:
que cada um rogue por fortaleza
para suprir suas muitas fraquezas.
Quando, cercados pelos inimigos no meio dos quais
muitos de nós habitamos como serviçais ou escravos,
revelarmos nossa natureza de (também nós, os cães!)
Combatentes da Luz,
nenhum Exército regular nos apoiará (os Fiéis
sequer sabem de nossa existência),
e o inimigo não fará prisioneiros a tais como nós.
Pelo contrário, muitos ainda rirão e escarnecerão
de nosso esforço. Não importa;
cada um tenha a sua morte como certa,
cada um
não esqueça em nenhum instante
do Poder da Chave que abriu nossos sepulcros.
Em sua misericórdia, Ele reservou-nos
um lugar na Batalha Final, e deu honra aos sem-honra.
Ele conta conosco, aleijados e prostitutas,
e disse em sonhos a Wass Gordo
que ama-nos a todos;
- marchemos, pois para o matadouro
a morrer para que Ele viva!

Não teremos armas de Luz,
como os Alados, ou armas de Fogo como os Fiéis.
Os Irmãos Alados estarão ocupados
na ofensiva principal contra os Avatares do Ar
e os Servos Fiéis precisam cercar todas as hostes inimigas em terra
em uma única noite, e toda a força lhes será necessária.
Lutaremos com paus e pedras,
navalhas e estiletes,
se necessário for
explodiremos nossos corpos sem valor
(no mês de Lazzul fizemos circular a instrução
acerca do fabrico de explosivos bio-corporais.
Os que ignoram tal comunicado contatem
seus líderes de Rede).
Desde já nossa honra a Parcehass, Eizel-Sem-Pernas
e Monóculo, que foram as primícias dos que
ofereceram-se para serem portadores
das bombas corporais. Honra ainda a Helceia
de Hoxx, por
...   ...   ...
(neste ponto foi rasgada a carta).

Sammis Reachers

segunda-feira, 2 de abril de 2012

DESCENDO COMO POMBA

Inédito de J.T.Parreira

 A pomba desprendeu-se dos ramos
da árvore da vida, veio em círculos
na invisível matéria do vento
chega
para desatar os laços
que fechavam o Amor nos livros da Lei
não desmaiou ao cântico das estrelas
nem escondeu os olhos diante do sol

nem desatou a cabeleira dos cometas
chegou e suavemente
dá por si sobre o Jordão para deixar
no Filho Amado um brilho nos Seus olhos .

1/2/2012
 
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