quinta-feira, 26 de março de 2015

Hino à Loucura






Poema de Ricardo Mendes Rosa

Vivemos a vida de pernas para o ar,
sem ânsia de comer, de beber ou gastar.
Confiamos no ganho da providência,
procuramos morrer todos os dias
e viver eternamente.
Não vivemos pela força, nem pela arma,
procuramos ser como ovelhas simples.
Damos a cara à mão, tanto para o afago,
como para a injúria que levantam contra nós.
Somos simples na maneira de viver,
prudentes e sinceros.
Não vivemos para nós mesmos, como
quem esculpe uma imagem e se auto adora nela.
O mundo não é a nossa casa, nem a carne a nossa roupa.
A morte não é a nossa prisão, nem a doença a nossa cela.
Vivemos a vida de pernas para o ar,
na ânsia de algo que há-de acontecer.
Vivemos a vida e morremos,
na certeza de que para nós, morrer é viver.


28/02/2015

terça-feira, 10 de março de 2015

CALEB



“Há anos que escrevo o mesmo poema”
J. T. Parreira

Sou ainda o mesmo que fui outrora
ainda hoje os mesmos olhos
olham por dentro das mesmas pupilas
e procuram o mesmo infinito

há quarenta anos que sonho
o mesmo sonho
que este passeia pelo monte e lhe cria
um nome, Hebron,
e o soletra letra a letra,
como o nome de um amigo, com
o mesmo suspiro em silêncio

há quarenta anos que espero
então era soldado e lavava
a espada no sangue de gigantes
hoje lavo-a na chuva
que se acumula no vale

sou o mesmo rosto furtivo
à viragem do vento e recalcitrante
à passagem dos dias

há anos que escrevo o mesmo poema
que fala de promessas e de campos largos
e montes para conquistar
a mão do Senhor abrindo a minha
a pulso no papiro

os cabelos que hoje são brancos
já o eram então há quarenta anos:
embora mais longos

Rui Miguel Duarte
6/03/2015
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