domingo, 27 de novembro de 2016

POESIA DE CARLA JÚLIA



Acordei
As portas do rosto
Me traziam o mar
A imensa ausência de ser
Então as portas se fecharam
E o mar se fez em mim
Regurgitando em minhas pálpebras
Como se tivesse perdido a âncora da vida.



NOÉ

Rótulos do tempo
Tomados aos bocados por seus cabelos
Em seus olhos cabia apenas o dilúvio
Que lhe envolvia
Como pescador de lembranças.
Nas entranhas da tenda
Se desfazia dos nós da vida
Entre os cachos de vinho
Que não guardaram a nudez de sua euforia.


NO TEU SILÊNCIO

Como se o vazio se pudesse explicar
Tento eu escrever este poema
Lançando pedras no rio
Da imaginação
Para por um instante crer que estás aqui
Ou ali, estendendo o olhar em um fio de amor
Para que te veja e retorne com um riso...
Mas no final a pedra afunda
E eu continuo aqui
Tentando reescrever o poema
Que no baú da graça deixei.



© Poemas de Carla Júlia, Maputo, Moçambique
Do livro inédito "Aos Pés da Palavra"

domingo, 13 de novembro de 2016

Dois inéditos, de João Tomaz Parreira



(Arte: Veronika Pinke)



PARTIDA

“Espera por mim que eu voltarei, mas tens
De esperar muito.”
 Konstantin Símonov


Agora que o cálice está próximo
E começo a ficar sem palavras
E sinto nos meus lábios a sede
Dos homens que existiram e vão
Continuar a existir, o meu cálice
A encher-se de dores e terei
De as suportar e se tornarão em
Versos de poemas, por todo o mundo
Esperem por mim.

13-11-2016
© 



VISÃO

Eu pude ver-Te a segurar o cálice
E os Teus olhos como duas escadas onde
Subiam e desciam anjos a confortar-Te
E os romanos a estender o Teu corpo
Na madeira da cruz, e o carmesim
Do sol a decompor-se de tristeza
A Tua morte
Encheria páginas e páginas
De perdão.

13-11-2016


©  João Tomaz Parreira  


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